Sustentabilidade

Natalia Allenspach de Souza

Houve um tempo em que as coisas duravam mais. ...

Sustentabilidade: a nova regra do mercado

        Houve um tempo em que as coisas duravam mais. Comprar um eletrodoméstico era praticamente uma aquisição para toda a vida. Mesmo porque, se ele quebrasse, era só levar para o conserto. Embalagens retornáveis eram regra, e não exceção. Como tudo era muito caro, as pessoas tinham o hábito de pesquisar bastante antes de comprar. Numa época em que nem se pensava em sustentabilidade, as indústrias investiam em produtos de qualidade, resistentes e duráveis.

       Na Califórnia existe uma lâmpada que está acesa desde 1901, em um antigo quartel de bombeiros. Mas produtos como este perderam rapidamente seu lugar no mercado. Ironicamente, coisas que quebram vendem mais. A prática da “obsolescência programada” – a redução intencional do tempo de vida de uma mercadoria – surgiu no início do século XIX. Uma análise mais crítica desta estratégia de mercado pode ser vista no documentário “The light bulb conspiracy” (http://www.imdb.com/title/tt1825163/), que conta como muitos produtos tornaram-se quase descartáveis e o quanto as empresas estavam lucrando com esta prática. Com a economia a todo vapor, ninguém estava disposto a perceber os problemas ambientais que iam se acumulando.

       Foram necessários muitos desastres naturais e a ameaça iminente do aquecimento global para que, finalmente, começássemos a questionar nossos novos hábitos consumistas. E, se até há pouco tempo atrás era preciso criar inúmeras medidas regulatórias para garantir que a indústria se adequasse, hoje a sustentabilidade vem se tornando a nova regra do mercado. A pressão vem de todos os lados: consumidores, ONGs, investidores e concorrentes. Aos poucos, empresários vão descobrindo que, atualmente, produtos e serviços mais sustentáveis vendem, e muito!

       A Natura adota um modelo de desenvolvimento voltado para a sustentabilidade desde sua criação, em 1969. Todas as linhas de seus produtos carregam algum componente de sustentabilidade, seja em sua formulação¹, seja na embalagem². Em 2000 foi lançada a linha Ekos, que é baseada no uso sustentável da biodiversidade do Brasil e na partilha de conhecimentos tradicionais. A sustentabilidade também serviu como inspiração para muitas empresas jovens, recém-chegadas ao mercado. A americana Terracycle (http://www.terracycle.net), fundada em 2001, transforma lixo reciclável em bolsas, mochilas e cadernos. No mesmo ano surgia a BloomEnergy (http://www.bloomenergy.com), que utiliza tecnologia da NASA para gerar energia limpa através de pequenos geradores, atendendo pessoas que vivem em locais muito isolados. Ao enfrentar desafios sociais e ambientais, estas empresas encontraram soluções que também geraram crescimento econômico.

       A maioria das empresas não tem uma herança tão verde, e entrar no nicho do ambientalmente correto e do socialmente justo exige grandes mudanças internas. O Walmart, por exemplo, tem como meta utilizar somente energia renovável. Para isso, instalou telhados verdes e modernizou sua frota, adquirindo veículos mais eficientes. Para poder oferecer produtos mais ecológicos, o Walmart seleciona a dedo novos fornecedores (como a Terracycle) e pressiona os antigos a buscar por soluções.

       É preciso lembrar que sustentabilidade não é uma receita pronta. Cada caso é um caso, e existem inúmeras maneiras de se adaptar. Mas algumas ferramentas podem ser muito úteis. Certificações, como a ISO 14.001, não garantem uma produção 100% sustentável, mas são um bom começo. A Global Reporting Initiative (https://www.globalreporting.org) é uma organização sem fins lucrativos que criou uma série de diretrizes para auxiliar empresas na busca pela sustentabilidade. No Brasil, o Instituto Akatu, em parceria com o Instituto Ethos, criou uma escala de sustentabilidade baseada nos princípios da Responsabilidade Social Empresarial. Todos estes indicadores auxiliam as empresas a ter um olhar mais holístico. Ao analisar o sistema como um todo, fica mais fácil identificar problemas e encontrar soluções.

       Pouco a pouco vai sendo resgatada a filosofia do passado, de que as coisas deveriam ser boas e duráveis ou “de qualidade”. Só que hoje o termo qualidade, que no passado tinha a durabilidade como principal atributo, tem seu significado expandido, passando a incluir a preocupação por uma produção mais limpa: matérias-primas renováveis, eficiência energética, baixa toxicidade. Durabilidade, neste novo contexto mundial, não significa apenas ganhos econômicos, mas também ganhos ambientais e sociais. Os novos modelos de negócios impostos pela sustentabilidade nos desafiam a buscar soluções, ao mesmo tempo em que são fontes ricas de inspiração para gerar inovação.

¹ Uso de matérias primas vegetais (em porcentagens variadas); certificação de origem orgânica ou florestal; redução do uso de água e da emissão de gases do efeito estufa; utilização de álcool orgânico; etc.

² Utilização de matéria prima reciclada; aplicação de polímeros vegetais; criação de embalagens recicláveis; etc.

 

Bibliografia:

Instituto Akatu pelo consumo consciente: http://www.akatu.org.br/

PATEL, H. (2010) Começa a era da inovação verde. Revista Amanhã, p. 39-59. Disponível em: http://www.amanha.com.br/sustentabilidade-internas/58-sustentabilidade-1/662-comeca-a-era-da-inovacao-verde

UNRUH, G. & ETTENSON R. (2010) Growing green – three smart paths to developing sustainable products. Harvard Business Review, p. 94-100.