Há pouco tempo falamos sobre felicidade, destacando as dimensões que a compõem ...

Sobre a Eudaimonia e a influência dos pais

Há pouco tempo falamos sobre felicidade, destacando as dimensões que a compõem – hedonia e eudaimonia. Posteriormente, comentamos sobre a maternidade e como são importantes os cuidados e carinho maternos no início da vida do bebê para sua formação e saúde psicológica quando adulto.

Felicidade e maternidade - dois temas intrinsecamente ligados - afinal, quando nos tornamos pais, o que mais desejamos é que nossos filhos sejam muito felizes. E como trabalhar para isto?

A resposta é: buscando, primeiramente, nossa própria felicidade!

E essa busca deve incluir o aspecto eudaimônico, que significa desenvolver o melhor de si mesmo, viver de forma congruente com suas crenças e valores, agir com virtude, cultivar o bem-estar duradouro e também o aspecto hedônico, que significa buscar prazer e conforto, seja através de meios físicos, emocionais ou mesmo cognitivos, como aquele trazido pela interação social ou pela arte. Isto porque a felicidade dos nossos filhos reflete nossa própria felicidade, como mostra uma recente publicação do Journal of Happiness Study (1).

Esta publicação apresenta o resultado de dois estudos que foram conduzidos com estudantes com o objetivo de avaliar como se dá a busca da felicidade pelos mesmos considerando a observação da vida de seus pais e o estilo de criação com o qual foram educados. Em relação à criação, foram avaliados dois aspectos já bem estabelecidos: responsividade e exigência. A exigência parental inclui todas as atitudes dos pais que buscam de alguma forma controlar o comportamento dos filhos, impondo-lhes limites e estabelecendo regras. Já a responsividade refere-se àquelas atitudes compreensivas que os pais têm para com os filhos e que visam, através do apoio emocional e da bi-direcionalidade na comunicação, favorecer o desenvolvimento da autonomia e da autoafirmação dos jovens (2).

O primeiro estudo, do qual participaram 105 estudantes canadenses, avaliou o grau de eudaimonia e hedonia do voluntário relacionando-o ao estilo de criação adotado por seus pais.  Foram aplicadas questões sobre felicidade contemplando a eudaimonia (ex: Você tem um ideal de vida? Você busca fazer aquilo que acredita?) e a hedonia (ex: Você se diverte? Você procura relaxar?) e também um extenso questionário sobre o estilo de criação dos pais. Este estudo mostrou que os indivíduos orientados para a eudaimonia tiveram influência tanto de pais exigentes, como de pais responsivos, mostrando que esta dimensão da felicidade é cultivada quando os pais proporcionam à criança estrutura, disciplina e responsabilidade, mas simultaneamente satisfazem seu anseio por autonomia. Por outro lado, foi observado que a exigência e a responsividade influenciam muito pouco a hedonia. Os autores acreditam que esta dimensão da felicidade possa ser influenciada por outros fatores, como a convivência com colegas, circunstâncias ambientais e afetividade positiva. Outra observação interessante deste estudo foi que as pessoas que buscaram mais intensamente a dimensão eudaimônica foram aquelas cujos pais eram mais exigentes, reforçando a ideia de que é preciso fornecer estrutura, visão e desafios para a criança caso os pais queiram que ela trilhe um caminho de excelência.

No segundo estudo, participaram 110 estudantes americanos, e foram avaliadas duas questões principais: 1) a busca dos voluntário pela felicidade; 2) a felicidade de fato, medida através de questionários de bem-estar relacionado às duas dimensões da felicidade (eudaimonia e hedonia). O estudo relacionou essas duas questões a outros dois parâmetros: A) influência do modo de vida dos pais; B) conversas dos mesmos estimulando os filhos a buscarem a felicidade (endossamento verbal), tanto em seus aspectos eudaimônicos (fazer o que gosta, lutar pelo que acredita), como hedônicos (se divertir, relaxar)

Foi demonstrado que acontece uma influência positiva na busca da felicidade em seus dois aspectos (eudaimonia e hedonia) tanto quando os pais apenas reforçam verbalmente sua importância, como quando colocam isto em prática no seu modo de vida. Porém, em relação à felicidade em si (tanto no que se refere ao bem-estar atrelado à hedonia, quanto principalmente à eudaimonia), não foi verificada influência positiva no caso dos pais que apenas endossavam verbalmente a importância da felicidade, sem a colocar em prática em suas próprias vidas.

Ou seja, quando falamos da importância da felicidade para nossos filhos até os motivamos a buscá-la, mas somente quando colocamos o discurso em prática, agindo de modo coerente com o que acreditamos, sentindo-nos úteis e repletos, é que os impulsionamos para serem felizes!

“A palavra marca, mas o exemplo arrasta”, como está escrito nas escrituras sagradas.

 

Referências Bibliográficas

Huta, V. Linking Peoples’ Pursuit of Eudaimonia and Hedonia with Characteristics of their Parents: Parenting Styles, Verbally Endorsed Values, and Role Modeling. J Happiness Stud (2012) 13:47–61;

da Costa, F; Teixeira, M.; Gomes, W. Responsividade e Exigência: Duas Escalas para Avaliar Estilos Parentais. Psicologia: Reflexão e Crítica, 2000, 13(3), pp.465-473.