Sustentabilidade

Marco Varella

Para promover a aplicabilidade de pesquisas básicas em psicologia e ciências do comportamento, é importante usar a criatividade no pensar as novas pesquisas em neuropsicologia. ...

Neuroestética

Neuroestética: neurociência e arte sem aplicações?

Para promover a aplicabilidade de pesquisas básicas em psicologia e ciências do comportamento, é importante usar a criatividade no pensar as novas pesquisas em neuropsicologia. O meio acadêmico brasileiro está progredindo, porém ainda tem muito de sua produção científica voltada mais para a pesquisa básica do que para a aplicada. Basta ver o quão baixa é a taxa de novas patentes concedidas por universidades no país.

Esta não é apenas uma questão de falta de políticas públicas voltadas para a promoção de pesquisas que vão originar conhecimentos, idéias e produtos relevantes para a industria e o mercado – o famoso culpar o sistema. Mas sim temos que ser capazes, nós mesmo, de enxergar além das fronteiras cotidianas da nossa própria área de pesquisa. Tradicionalmente a Psicologia possui vertentes de aplicação mais proeminentes na terapia e aconselhamento e em recursos humanos. Pouco se tem dedicado em aplicar os conhecimentos de como nossa mente e cérebro funcionam em outras áreas.

Para que serve algo inútil?

A criatividade artística é famosa por dotar as pessoas da capacidade de vislumbrar coisas inimaginadas. Entretanto é ainda muito influente a noção de que o produto artístico não tem função alguma, além de ser apenas obra de arte. É a noção da ‘arte pela arte’.

Da mesma forma, ao responderem a questões sobre a serventia das pesquisas em neurociência, os pesquisadores dizem que trata-se apenas de pesquisa básica, que um dia no futuro distante poderá trazer alguma relevância prática. É a resposta clássica da ‘ciência pela ciência’. Veja bem, não estou advogando para o fim da pesquisa básica, que é de extrema importância téorica. Mas estou apenas mostrando que ambas podem ocorrer ao mesmo tempo se começarmos a imaginar criativamente possíveis aplicações para o que já estamos pesquisando.

[legenda: Do encontro entre a neurociência e as artes surgem aplicações inesperadas. Fonte: [ Wikipedia]

Então, poderia a ‘arte pela arte’ e a ‘neurociência pela ciência’ serem usadas juntas para criar aplicações práticas? A resposta é sim, e a nova área da Neuroestética, ainda pouco conhecida no Brasil, é uma das opções à mão.

A Neuroestética e a beleza no cérebro A Neuroestética visa basicamente entender como o nosso cérebro percebe/produz a beleza no mundo. Pesquisas recentes na área têm nos ensinado que para o cérebro, beleza é beleza não importa onde ela é encontrada.

Um artigo recente de revisão publicado na revista científica NeuroImage sobre a neurociência da beleza analisou todas as áreas cerebrais relacionadas ao julgamento estético proveniente de diferentes modalisades sensoriais [pdf]. Eles estudaram 93 pesquisas em neuroimagem sobre respostas estéticas positivas vindas da visão, audição, gustação e cheiro. Para o autor Steven Brown, professor da Universidade McMaster no Canadá, e seus colaboradores "estudos em neuroimagem tem mostrado de maneira convincente que não existe evidência alguma de que obras de arte ativem áreas distintas daquelas já envolvidas na apreciação de objetos do dia-a-dia, importantes para a sobrevivência e reprodução, como na suculência da comida e na atratividade dos parceiros amorosos" diz Brown.

Lindas implicações

[legenda Mini relógio de bolso, mais do que útil, é um obra de arte. Fonte: [ Wikipedia]

Agora pense nas implicações, nós não consumimos coisas só porque elas funcionam, mas também por aparentarem, soarem, terem gosto e cheiro bons, agradáveis, cativantes. Então, conhecimento desse tipo pode ser muito importante para a indústria no desenvolvimento de novos produtos mais atraentes, desde jingles até embalagens, passando por fragâncias, cremes hidratandes e alimentos.

Claro que esse conhecimento traz também grandes responsabilidades. Ele deve ser usado não visando manipular as pessoas para comprar por comprar, pois o consumismo já está acabando com os ecossistemas do nosso planeta. Logo, um uso inteligente do conhecimento em neuroestética, que é apenas umas das milhares de áreas relacionadas ao bem-estar, como no desenvolvimento de lindas embalagens recicláveis que necessitam de menos energia para serem produzidas, pode ajudar pessoas a reconhecer e gostar de opções de produtos sustentáveis. Imagine as possibilidades.

Por Marco Varella, biólogo, mestre e doutor em psicologia experimental e divulgador de ciência.