Como saber o modo que uma experiência é entendida, sentida e interpretada pelas pessoas? ...

Experiência pré-experiência

Como saber o modo que uma experiência é entendida, sentida e interpretada pelas pessoas?

Enquanto buscava metodologias para abordar esta questão me deparei com um livro que dá bons insights de como começar organizando a questão antes de efetivamente começar a respondê-la. O livro é Customer Experience: Future Trends and Insights, de Colin Shaw, do qual adapto algumas ideias aqui.

Podemos ser bem cartesianos aqui e começar a abordar a questão dividindo o nosso objeto de dúvida, no caso a mente do indivíduo que passa por determinada experiência, em partes.

Uma sugestão de divisão seria esta em 4 partes:

Experiência pré-experiência

Intenção da experiência

Lembrança da experiência

Interação com a experiência

Aqui tratarei apenas do número um, experiência pré-experiência, que inclui a bagagem psicológica prévia que o indivíduo traz consigo para uma experiência, contendo em si preconceitos, intenções e associações geradas pela experiência.

Preconceito

Em um famoso experimento, realizado por Hastorf e Cantril[1], foi demonstrado como o preconceito pode manipular fatos de uma experiência. O estudo se utiliza de uma gravação de um jogo de futebol americano bem bruto entre duas faculdades americanas. Esta gravação foi mostrada para os alunos destas mesmas faculdades, e quando perguntados de qual time foi a culpa pelo jogo tão violento cada faculdade apontou a faculdade adversária como responsável. Ou seja, se o mesmo vídeo foi assistido pelos dois grupos, o que mudou foi que esta realidade foi percebida de maneira diferente e enviesada pelos grupos.

Até quando uma empresa (Macy´s, dos EUA) quer ajudar seus clientes avisando que sua conta pode estar sendo usada por outra pessoa de maneira fraudulenta, se o funcionário que faz a ligação está ligando de um destes call centers que ficam na Índia, por exemplo, o cliente ao invés de ficar agradecido com a gentileza da empresa em lhe avisar da fraude, acaba ficando mais desconfiado pelo fato do atendente ser um indiano do outro lado do mundo.

Claro que o preconceito pode ter seu lado bom e pode ficar bem aparente quando as coisas dão errado. Se uma companhia de boa reputação, como a Apple, por exemplo, comete algum erro, as pessoas tendem a pensar que isto é coisa normal, que erros acontecem e tudo bem. Mas se o problema for com uma empresa não tão popular, elas não serão tão generosas e compreensivas.

Fica claro o impacto emocional e subconsciente do preconceito das pessoas nas suas percepções e expectativa, mostrando que elas não são totalmente racionais tendo seu comportamento influenciado por estes sentimentos.

Expectativa

O que as pessoas esperam de uma experiência acaba influenciando na percepção desta. Se pensarmos em uma sala de espera de um médico já sabemos que as esperas são longas, então uma espera de 30 minutos não será tão desagradável como o mesmo tempo de espera em uma fila de banco, principalmente quando o carro está parado em local proibido já que seria apenas “uma paradinha rápida no caixa”.

Assim, aqui acontece algo interessante, afinal mudar as expectativas pode ser uma grande oportunidade de melhorar uma experiência, mas também existe um risco embutido quando o nível de expectativa das pessoas sobe. Por exemplo: a Disneylândia é famosa pela simpatia dos seus funcionários e por isso mesmo qualquer falta de simpatia de um funcionário acaba tomando grandes proporções, pelo menos bem maiores do que tomaria uma brincadeira de mau gosto disparada por um camelô numa barraca de rua.

Por isso, ao mudar expectativas deve-se estar sempre atento para que a mudança não tome a direção oposta à desejada.

Associação

O cérebro é formado por uma rede de conexões neurais, e por isso quando sentimos ou pensamos em algo acabamos fazendo ligações com outras experiências relevantes. Por conta disso que a nossa relação com um produto, serviço ou experiência depende não só da interação física com eles, mas também das associações geradas por cada pessoa.

A Coca-cola não é vendida só como um refrigerante. Se fosse o contrário, como explicar que ela vende mais que a Pepsi, sendo que esta última é mais preferida em testes cegos? Há algo associado a marcas, produtos e serviços que ultrapassam a utilidade em si.

Gera-se então a oportunidade de mudar a ideia que as pessoas tem sobre um produto, por exemplo, sem que o produto em si seja modificado. Veja o caso da bebida energética inglesa Lucozade, que era associada à doença por conta da campanha “Lucozade ajuda na recuperação”, e triplicou suas vendas no Reino Unido com o mesmo produto mas mudando a campanha de marketing para “Lucozade recupera sua energia perdida”.

Por isso é fundamental entender como estas associações são feitas para que tenhamos certeza que elas estarão sempre de acordo com o objetivo.

[1] 1954, citado em Plous, S (1993) The Psychology of Judgement and Decision-Making.